segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Imagem marrom



Primeiro nos acorrentaram, depois nos colocaram em um miserável porão de navio, passamos dias e dias tendo nosso corpo rasgado pelas duras madeiras do chão, ouvindo apenas nosso estômago e o nosso medo.
Atracamos no porto e fomos levados, atrelados por nossos grilhões,  meio mortos, meio vivos, para aquela que seria a nossa primeira escola, uma senzala.
Ali recebemos um dos muitos ensinamentos a que teríamos direito: a lei da chibata, os outros também eram muito parecidos: “Não fale, você não tem voz.”, “Não reze, você não tem alma.”, “Não olhe para cima, a liberdade não te pertence.”, “Não pense, porque eu te proíbo.”, “Não sonhe, porque você não tem esse direito.”.
Centenas de anos se passaram desde que a chibata deu lugar a pseudodemocracia em que vivemos. Hoje, não moramos mais em senzalas, estabelecemos moradia nos morros das grandes cidades; não transitamos mais pela casa grande, somos invisíveis limpando o chão; não temos nossa carne cortada pelo couro curtido, mas amaciada pelas conduções lotadas.
          Não temos, não somos, não existimos!
Em nenhum momento nos demos conta disso, porque jamais soubemos de fato a nossa história, abrimos mão desse conhecimento em troca do estereótipo, deixamos que nos chamassem de favelados, sem instrução, sem cultura, sem futuro.
Muitos de nós até sentem orgulho de serem chamados por essa alcunha. O orgulho leva ao preconceito, o preconceito à dominação e aí começa tudo de novo: orgulho, preconceito, preconceito, dominação.
Felizmente, outros resistem.
Em 9 de agosto desse ano, 2014, em Ferguson, Missouri (EUA), um adolescente negro foi assassinado por um policial branco. Imediatamente seus “irmãos” se levantaram e foram às ruas protestar e reacenderam as discussões sobre as questões raciais naquele país. Atitude louvável, não?
Já aqui, isso é tão comum que nem protestamos, apenas damos de ombros e nos lamentamos. Salvo, é claro, o caso de Vinícius Romão, rapaz negro que foi confundido com um assaltante e acabou indo parar na cadeia. O que alegaram? Ele parecia com a descrição dada pela vítima sobre o seu algoz: negro, magro, cabelos crespos e olhos castanhos. Ao que me consta essa descrição condiz com a de boa parte dos brasileiros.
          Ir contra uma imagem pré concebida não é fácil, anos de sedimentação deixaram-na bem acomodada no pensamento de muitas pessoas. Quando uso o termo genérico “pessoas”, não quer dizer que me refiro apenas aos que se consideram brancos, isso seria patético! Falo dos negros, dos mestiços e dos índios, até porque o preconceito não tem fronteiras raciais.

          Lutar contra o racismo é lutar a favor da união dos seres humanos, da humanidade, até porque esse conceito ultrapassa a cor da pele.

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